"Quando vemos o amor como uma combinação de confiança, compromisso, cuidado, respeito, conhecimento e responsabilidade, podemos trabalhar para desenvolver essas qualidades ou, se elas já forem parte de quem somos, podemos aprender a estendê-las a nós mesmos. O popular tratado A trilha menos percorrida, de M. Scott Peck, destaca e reforça a importância do compromisso. Disciplina e devoção são necessárias para a prática do amor, ainda mais no início dos relacionamentos. De acordo com Peck:
Seja ou não superficial, o compromisso é a base de qualquer relacionamento genuinamente amoroso. O compromisso profundo não garante o sucesso da relação, mas ajuda mais a garanti-la do que qualquer outro fator. […] Qualquer um que esteja realmente preocupado com o crescimento espiritual do outro sabe, consciente ou instintivamente, que só pode alimentar esse crescimento através de um relacionamento constante."
— Tudo sobre o amor: novas perspectivas de bell hooks, autora nascida de Vênus e Saturno em Libra na casa 5, testemunho simbólico de alguém que viveu a afetividade reivindicando tanto o prazer quanto o compromisso.
Abro essa edição falando de amor, constância e conflito: Vênus e Marte estão unidos em Capricórnio. Se a temporada retrógrada da Vênus em Capricórnio ao longo do mês de janeiro foi marcada por algum tipo de bloqueio ou algo de devastador nos relacionamentos, o ressurgimento da Vênus no céu, escapando dos raios solares, carrega consigo o melhor que a Vênus caprina tem para oferecer: amor-parceria, amor-construção, amor-compromisso. A constância da prática do amor sob a égide do Tempo, o que eleva o afeto a um outro patamar de amparo e confiança.
Vênus em Capricórnio expressa o valor que há em saber onde se está pisando, de sentir a terra firme sob os pés: acordos claros, respeito, praticidade e senso realidade em relação ao que cada um está vivendo. Está em vislumbrar um projeto de vida: o valor no amor construído a várias mãos ao longo dos anos, ainda que esse amor não seja estático, mas se construa sabendo que os espaços erguidos possam ser ressignificados — mudo eu, muda você, muda o amor também. Quando ele parte de uma base sólida esses vínculos podem se transformar e amadurecer.
Algumas mudanças, é claro, também geram atritos e impasses inéditos; entre concessões e evasivas eventuais, pode o conflito ser bem vindo? A bell hooks nos diz que sim:
"Viver numa cultura em que somos encorajados a procurar alívio rápido para qualquer dor ou desconforto criou uma nação de indivíduos facilmente devastados pela dor emocional, embora ela seja relativa. Quando encaramos a dor nos relacionamentos, nossa primeira reação geralmente é cortar os laços em vez de manter o compromisso.
Quando seguimos o caminho do amor e o conflito emerge dentro de nós, ou entre nós e outras pessoas, é desanimador, especialmente quando não conseguimos lidar com nossas dificuldades facilmente. No caso dos relacionamentos românticos, muitas pessoas temem ficar aprisionadas num vínculo que não está funcionando, então fogem no início do conflito. Ou, de modo autoindulgente, criam conflitos desnecessários como forma de evitar o compromisso. Elas fogem do amor antes de conhecer a sua graça. A dor pode ser o limiar que precisam cruzar para participar da felicidade do amor. Ao fugir da dor, elas nunca conhecem a totalidade do prazer de amar."
As rupturas e separações são de Marte, o planeta de natureza oposta à Vênus: a agressividade que existe em todos nós e nos motiva a romper situações de abuso, reunir coragem para enfrentar injustiças, romper com o que nos violenta ou adoece. Raiva como força motriz. Marte entrou em Capricórnio no último dia 24 e dizemos que esse é um Marte exaltado, pois ocupa um signo de grande valia para si: a dureza do tempo e as dificuldades da vida como combustível para aprender a atacar e defender quando preciso. Disciplina, resistência e prontidão são as palavras de ordem. O que essa temporada de Marte em Capricórnio inspira? Faça os cortes necessários; reúna a coragem para dar passos na direção de suas vontades; coloque na mesa o problema que se arrasta há meses; compartilhe-o com quem está diposto a ajudar; exercite afeto e cuidado tanto quanto força e praticidade; celebre os laços de quem te acompanha há muitos anos. Aja com senso de realidade e objetivos em mente, mas não deixe de agir: Marte em Capricórnio tem disposição de sobra para deixar de ir à luta. E conjunto à Vênus, à luta se une ao campo dos desejos: conquistar o que se anseia e festejá-lo com quem se ama é a maior das vitórias.
Vênus e Marte caminharão unidos em Capricórnio até 6 de março. Daqui até lá, amores e desamores estarão embaralhados num laço só: de cortes definitivos a reconciliações realistas, tudo é possível. Fica evidenciado nesse período a forma como nos colocamos nos relacionamentos na materialidade dos afetos — o que inclui tudo o que sustenta o elo entre nós e os outros; o que se dá, o que se recebe; a ternura que toma forma no dia a dia e no passar dos anos; o gestos e os objetos; o que já foi, e o que ainda virá.
céu da semana: 6 a 12 de fevereiro de 2022
A semana traz a Lua do fim de Áries até Câncer, alcançando o Quarto Crescente já na terça-feira. No geral parece uma semana razoavelmente produtiva, com os principais aspectos difíceis na própria terça-feira. Um grande porém é o fato de Sol e Saturno estarem conjuntos em Aquário (Saturno está combusto!) — a última sexta-feira, dia exato da conjunção, coincidiu com o número de mortes diária batendo novamente a casa dos mil, depois de meses abaixo disso. Já Mercúrio saiu da sua retrogradação na última sexta, mas ainda está bem lento, só recuperando sua velocidade média lá pro meio do mês. Ainda assim, na marcha lenta, já dá pra retomar o ritmo de estudos e escrita com algum vigor.
Domingo, 6 de fevereiro | dia do Sol
Lua em Áries completa quadratura com Mercúrio em Capricórnio, tensionando assuntos do prazer e do sustento, possíveis entraves financeiros, complicações lidando com dinheiro e outras pessoas. Apesar disso, dia de rua e lazer, espairecimento. À noite a Lua ingressa em Touro.
Segunda-feira, 7 de fevereiro | dia da Lua
A noite de sono pode ser reparadora ou imaginativa, com a Lua em Touro caminhando em direção ao sêxtil com Júpiter ao longo da madrugada e manhã, aspecto que sem completa no início da tarde. No meio da tarde a Lua em Touro ainda completa trígono com Marte e, à noite, com Vênus, ambos em Capricórnio, o que dá uma ênfase de praticidade mas também um certo corpo mole, movido a dúvidas ou receios. Procure objetividade e "se ouvir o som de cascos, pense em cavalos, não zebras".
Terça-feira, 8 de fevereiro | dia de Marte
A terça traz o dia mais incômodo da semana, com a Lua alcançando quadratura com Saturno e o Sol na madrugada e manhã — trâmites no âmbito do poder, envolvendo autoridades. Dia desgastante e cansativo, mas que vai no tranco do pragmatismo porque a Lua busca o dia todo o trígono com Mercúrio, completo no fim da noite. Bom para reuniões, diálogos e acordos, embora exija muita atenção para uma das partes envolvidas não ser prejudicada em detrimento da outra.
Quarta-feira, 9 de fevereiro | dia de Mercúrio
Na quarta o dia começa com o singelo ingresso da Lua em Gêmeos logo no início da manhã, o que confere agilidade e leveza, ideias a mil, fofoca, agitação, aquele rebuliço; o próximo aspecto dela é com Júpiter, mas só no dia seguinte, então a quarta é um dia meio em suspenso, menos produtivo, disperso, mas também bem-humorado e fantasioso.
Quinta-feira, 10 de fevereiro | dia de Júpiter
Lua em Gêmeos alcança a quadratura com Júpiter no início da madrugada, o que pode ocasionar sonhos agitados e confusos, e durante o dia persegue o trígono com Saturno em Aquário, garantindo um diálogo preciso nas relações e favorecendo a comunicação num geral. Melhor dia da semana para resolver documentos, assinar contratos, encaminhar assuntos meio burocráticos e que envolva lidar com outras pessoas e com bens/finanças suas de forma objetiva.
Sexta-feira, 11 de fevereiro | dia de Vênus
A sexta traz um trígono entre Sol em Aquário e Lua em Gêmeos ao raiar do dia, o último aspecto da Lua geminiana. Uma sexta meio fria e insípida, que a gente leva adiante na base do sarcasmo, sabe? Apesar disso, sem tensão, só a cabecinha com ideias e pensamentos a mil. À noite a Lua ingressa em Câncer, um gostinho de acolhimento e nutrição pra encerrar a sexta na casa ou no bar que você chama de lar.
Sábado, 12 de fevereiro | dia de Saturno
O sábado é uma delícia, com a Lua em Câncer se aproximando do trígono com Júpiter em Peixes, que se completa pela tarde. Uma sensação meio de desanuviar preocupações, como vagar à deriva e encontrar o melhor resgate possível. Um sábado a se celebrar com quem é boa companhia.
notas astrológicas
sobre Marte e a covardia
O ingresso de Marte em Capricórnio coincide com o exato dia do brutal assassinato de Moïse Kabagambe, em 24 de janeiro. Não me interessa aqui esmiuçar astrologicamente esse evento em respeito à mais uma vida negra perdida em nome da barbárie da violência, mas vou usar dessa ocasião para ilustrar astrologicamente algumas problemáticas que Marte pode significar.
No geral, considera-se que planetas dignificados (no caso de Marte: Áries, Escorpião e Capricórnio) operam de forma mais construtiva e menos danosa do que quando estão debilitados (Marte: Touro, Câncer e Libra), mas um Marte exaltado também pode produzir exageros ou brutalidade, a depender do contexto. Um exemplo foi o trânsito de Marte por Câncer no primeiro semestre de 2021, quando houve a chacina na escola infantil em Santa Catarina e a chacina do Jacarezinho no Rio de Janeiro.
O Marte que agora transita por Capricórnio até 6 de março faz uma perigosa oposição à Lua em Câncer do mapa do Ingresso Solar em Capricórnio, o mapa vigente sobre esse trimestre (Lua que se repetiu inclusive no mesmo grau de Câncer na última Cheia, dias antes do ocorrido): o povo na mira da violência.
Um caso interessante de se observar é a data da criação da Polícia Militar no Brasil: dada a natureza da instituição, era de se esperar a presença de um Marte fortalecido ou apoiado por outros planetas em signos de Marte. O céu do dia da fundação da PM, no entanto, é esse aqui:
Sobre a criação da Polícia Militar brasileira, vale o seguinte contexto histórico:
"Até o início do século XIX não existiam instituições policiais militarizadas em Portugal (o Brasil ainda era apenas uma colônia), e a Coroa Portuguesa fazia uso de unidades do exército quando necessário. A primeira corporação com essas características foi a Guarda Real de Polícia de Lisboa, criada pelo príncipe regente D. João em 1801, tomando por modelo a Gendarmaria Nacional (em francês: Gendarmerie Nationale) da França, instituída em 1791.
O conceito de uma gendarmaria nacional surgiu após a Revolução Francesa, em consequência da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, na qual se prescrevia que a segurança era um dos direitos naturais e imprescindíveis; contrapondo-se à concepção vigente, de uma força de segurança voltada unicamente aos interesses do Estado e dos governantes.
Com a vinda da família real portuguesa para o Brasil, a Guarda Real de Polícia permaneceu em Portugal; sendo criada outra equivalente no Rio de Janeiro, com a denominação de Divisão Militar da Guarda Real de Polícia, em 13 de maio de 1809." — da Wikipédia [grifos meus]
No dia da criação da PM no Brasil, Marte ocupava o signo de Libra, um Marte exilado; em seu pior, um Marte que indispõe o conflito, se isenta e acoberta a injustiça, lavando as mãos para não se comprometer com ninguém. Marte exalta Saturno, mas faz com ele um aspecto frágil de sêxtil e separativo, já que Saturno está retrógrado e caminha para longe de sua vista: a função de proporcionar segurança e proteção é frágil e incipiente.
Marte recebe Vênus em Gêmeos por um trígono de ar, o aspecto mais harmonioso que faz com outros planetas, e testemunha aqui que o compromisso da força marcial se dá a serviço das elites, da valorização de uma população abastada. Com Júpiter em Áries, Marte forma uma oposição, um testemunho da violência descontrolada (pois Marte exilado), exagerada e injusta (oposição à Júpiter). A oposição de Marte e Júpiter expressa algo mais ou menos assim: onde há descaso, arbitrariedade e covardia, não cabe solidariedade e senso de cuidado comum.
É significativo também o fato da fundação da instituição se dar com a Lua exaltada Minguante, prestes a desaparecer no céu: a Lua é o povo, e é ele que mingua e desaparece — atingido por bala perdida ou assassinado à revelia de ações de "segurança" nas comunidades. Sob esse céu, o corpo policial que mais mata e morre no mundo surgiu, há 212 anos atrás; inúmeros problemas sociais são oriundos consequentes de sua criação, e um rastro de sangue se alastra de lá até aqui.
nas frestas
[texto postado essa semana no instagram, replico aqui pra quem não leu <3]
A sabedoria popular diz que cabra come até pedra: uma boa analogia para um signo como Capricórnio, que, regido por Saturno, expressa um tipo de dureza natural, que também se torna resistência. A curiosidade caprina pela procura de alimento é a razão da eventual ingestão de pedras, claro — tendo leguminosas, raízes e folhas, não há por que se submeter à aspereza inoportuna. No meio do caminho, porém, há de se encontrar algumas pedras e engoli-las involuntariamente.
Diz-se também que as pessoas saturninas e com forte presença de Capricórnio no mapa natal (a depender do posicionamento, claro), vivem de forma mais tranquila e bem-sucedida conforme vão ficando mais velhas. Capricórnio, um território de afinidade aos dois maléficos — exaltação de Marte e domicílio de Saturno —, de fato confere aos planetas essa resistência-insistência que, ao me parece, tem muito a ver com o acúmulo de aprendizado ofertado pelo decorrer do Tempo. Talvez a versão humana da cabra que eventualmente engole pedras seja a das pessoas que colecionam pedras literais ou metafóricas, como se reunissem um museu de equívocos e desenganos que servem de marcadores de uma trajetória; nem sempre é apego, mas visão de futuro: uma pedra sozinha não faz muita coisa, mas algumas dezenas constroem uma morada. Sorte mesmo é viver o suficiente para construir o que se almeja.
Essa semana relembrei essa colagem que fiz lá em 2019, durante meu retorno de Saturno em Capricórnio. Chamei ela de “cartografia sensorial”, nome que surgiu sem que eu soubesse bem o porquê. Hoje penso nela como uma revelação de sensações sobre a própria pele (o maior órgão do nosso corpo, regido por Saturno): as diferentes texturas, a água corrente e a submersão, a aridez dos grãos de areia, o afago do vento, as rajadas de chuva. Ainda que se renove periodicamente, é a pele a interface de toda experiência tátil que já vivemos; sulcos, rugas, marcas de expressão e cicatrizes são as impressões saturninas sobre um corpo que, estando vivo, segue resistindo ao efeito do tempo, mas não sem carregar consigo alguns suvenires da viagem.
Um abraço e até semana que vem,