"O conceito mesmo de humano, em sua encarnação moderna, exprime o dilema de uma criatura que somente pode conhecer o mundo, do qual é existencialmente uma parte, quando se aparta deste. Mesmo assim, na nossa experiência como habitantes, ao nos movimentarmos através do mundo em vez de de ambular sobre sua superfície, nosso conhecimento não se constrói como uma acumulação externa, senão que cresce e se desenvolve desde o interior mesmo de nosso ser terreno. Crescemos no mundo à medida que o mundo cresce em nós.”
— Tim Ingold , Being alive: essays on movement, knowledge and description
“O ato de atravessar o espaço nasce da necessidade natural de mover-se para encontrar alimento e as informações necessárias para a própria sobrevivência. Mas, uma vez satisfeitas as exigências primárias, o caminhar transformou-se numa fórmula simbólica que tem permitido que o homem habite o mundo. Modificando os significados do espaço atravessado, o percurso foi a primeira ação estética que penetrou os territórios do caos, construindo aí uma nova ordem sobre a qual se tem desenvolvido a arquitetura dos objetos situados. [...]
O caminhar, mesmo não sendo a construção física de um espaço, implica uma transformação do lugar e dos seus significados. A presença física do homem num espaço não mapeado - e o variar das percepções que daí ele recebe ao atravessá-lo - é uma forma de transformação da paisagem que, embora não deixe sinais tangíveis, modifica culturalmente o significado do espaço e, consequentemente, o espaço em si, transformando-o em lugar. O caminhar produz lugares. Antes do neolítico, e, assim, antes dos menires, a única arquitetura simbólica capaz de modificar o ambiente era o caminhar, uma ação que, simultaneamente, é ato perceptivo e ato criativo, que ao mesmo tempo é leitura e escrita do território.”
— Francesco Careri , Walkscapes
“A vida é um processo de crescimento, uma combinação de situações que temos de atravessar. As pessoas falham quando querem eleger uma situação e permanecer nela. Esse é um tipo de morte.”
— Anaïs Nin
Inicio essa edição com uma pequena coleção de escritos de autores sobre percorrer espaços e atravessar situações. Atravessamento parece uma palavra precisa para descrever essa Lunação de Aquário, iniciada no primeiro dia de fevereiro, e que se encerrará no próximo 2 de março. O percurso como aprendizado, o movimento como processo cognitivo, o deslocamento como ganho de perspectiva e compreensão das coisas — muitas vezes, de formas desconfortáveis ou dolorosas. Na edição #23, a respeito do mapa da Lua Nova do dia 1 de fevereiro, escrevi o seguinte:
"Júpiter em Peixes na casa 4 nesse mapa me parece indicar grande volume de chuvas até o dia 16 de fevereiro, causando riscos inesperados como rompimentos de estruturas e danos em moradia; felizmente, não me parecem problemas do nível de gravidade do que houve no sul da Bahia no fim de dezembro. De toda forma, as chuvas de verão no Brasil são históricas e a falta de estrutura para amenizá-los não ameniza essa previsão."
Infelizmente, o nível de gravidade das chuvas que ocorreram em Petrópolis no dia 15 foram muito além do que eu poderia imaginar. Uma das piores partes de trabalhar fazendo previsões, porém, não tem a ver com acertar ou errar detalhes: tem a ver com ser afetado por elas. Petrópolis é a cidade onde nasci e cresci; assistir de longe a destruição de um lugar que vivi por tanto tempo causada por uma enxurrada não é só angustiante, mas me faz pensar sobre a ciclidade dos problemas que atingem a coletividade. Problemas antigos e recorrentes, que tomam proporções cada vez maiores e incontroláveis.
A Anaïs Nin, autora nascida de Sol e Júpiter em Peixes e Mercúrio e Saturno em Aquário, como esses que atravessam o céu hoje, escreveu também que "a vida se expande ou se encolhe de acordo com a nossa coragem". Coragem, de agir de com o coração — essa segunda metade da Lunação de Aquário, sob o mapa da Lua Cheia em Leão, também tem a ver com isso. Entre rupturas e reuniões, negligência e mobilização coletiva, privação e possibilidade, o que nos resta? Não permanecer estático, inerte, retraído; agir com o coração, corajosamente, permitindo que a vida se expanda, cresça e seja compartilhada. Mover-se, apesar de; é nas passagens, cruzamentos e encruzilhadas que se encontra alguma saída.
Por várias razões, essa vai ser uma edição bem breve; não é mesmo toda semana que se há muito o que dizer ou escrever. Além do quê, fazer uma travessia envolve atenção aos passos dados. Essa, aliás, é uma lunação-travessia que nos encaminha, finalmente, para o fim do ano astrológico. Estamos chegando ao fim de uma longa (e frustrante, convenhamos) jornada. Façamos uso dessa lunação para observarmos, então, a caminhada coletiva que iniciamos em março de 2021, frente a onde estamos agora: o que deve ficar para trás? O que escolheremos carregar conosco nesse percurso que ainda não se iniciou?
céu da semana: 20 a 26 de fevereiro
Essa é uma semana de Lua minguante que vai de Libra até Capricórnio. Com a Lua ocupando os signos de Marte e Saturno na maior parte dos dias, o clima geral não é muito de leveza ou fantasia, mas de pragmatismo, defesa e uma certa animosidade justificada — "nada pessoal, só sem tempo para bobagens mesmo". Nesse caso aqui, não se trata de impessoalidade ou insensibilidade: são dias de emoções afloradas, sim, mas como a lembrança da dor de uma ferida aberta, o que pode levar a uma moleza ressentida ou a uma forte obstinação para reagir. Uma semana para engrossar a pele, escolher as brigas que valem comprar e valorizar a força e a amizade de quem se pode contar e confiar.
Domingo, 20 de fevereiro | dia do Sol
Hoje a Lua em Libra alcança o trígono com Saturno em Aquário logo pela manhã. Horas depois, ela faz as quadraturas com Vênus e Marte em Capricórnio entre o fim da manhã e início da tarde. É um dia de foco em trocas, lazer e espairecimento; há cordialidade e pequenos atritos podem ocorrer, mas não há muito combustível pra confronto, pelo contrário — há possibilidade de reencontros e reconciliação. Há um clima de aproximação inesperada, de algo agradável que surpreende as expectativas.
Segunda-feira, 21 de fevereiro | dia da Lua
A segunda começa com o ingresso da Lua em Escorpião logo pela manhã, já completando o trígono ao Sol em Peixes no fim da manhã. A Lua também busca a quadratura com Mercúrio em Aquário ao longo de todo o dia, alcançando ele no início da noite. O primeiro dia útil começa endurecido e com bastante resistência e teimosia. Um início de semana de um certo mau humor e disputa, pouco produtivo para reuniões e diálogos objetivos, já que o raciocínio parece turvo e inflexível. Priorize tarefas mais imaginativas ou que exijam menos mentalmente.
Terça-feira, 22 de fevereiro | dia de Marte
Na terça a Lua em Escorpião chega ao trígono com Júpiter em Peixes na madrugada; pode ser uma noite de sonhos vívidos e profundos. No início da tarde, a Lua alcança quadratura com Saturno em Aquário no início da tarde, e os sêxtis com Vênus e Marte em Capricórnio no início da noite. Durante manhã e tarde o dia segue bem rabugento e ríspido, parecido com o dia anterior, mas melhora no fim da tarde, ganhando força, estratégia e capacidade de ação. A noite deve ser bem mais enérgica e produtiva do que o período diurno.
Quarta-feira, 23 de fevereiro | dia de Mercúrio
A Lua entra em Sagitário no meio da manhã de quarta, um respiro de agilidade entre os signos de desconforto para a Lua (Escorpião e Capricórnio). A Lua sagitariana é uma rajada de fé e de confiança, criando na quarta-feira maior abertura nos relacionamentos, mas há pouca aderência e objetividade nas trocas e acordos. Há um ganho de entusiasmo favorável, mas que empolga e promete mais do que cumpre de fato. A Lua persegue a quadratura com o Sol em Peixes ao longo do dia, alcançando o Quarto Minguante no início da noite. Dentro dessa semana, o dia mais favorável para visibilidade pública e divulgação de notícias ou informações — atenção redobrada, no entanto, para não avaliar mal a situação.
Quinta-feira, 24 de fevereiro | dia de Júpiter
A quinta-feira traz a Lua em Sagitário completando três aspectos: um sêxtil com Mercúrio em Aquário na madrugada, uma quadratura com Júpiter no começo da manhã e um sêxtil com Saturno no fim da tarde. O foco aqui são questões de justiça, coletividade, autoridades e relacionamentos. Algum cuidado para não falar mais do que deve e com falhas de comunicação. No geral, não é um dia danoso ou tão difícil, mas que pode gerar alguma gafe.
Sexta-feira, 25 de fevereiro | dia de Vênus
O único movimento da sexta-feira é o ingresso da Lua em Capricórnio no início da tarde, que instaura algum tom de pragmatismo e concentração antecipados (até desejados) nos dias anteriores. Compartilhando terreno com Vênus e Marte (os quais encontra só no domingo), é como se a Lua encontrasse rostos conhecidos num local estranho e inóspito — não é o ideal, mas é melhor do que estar só; não chega a ser um dia de conforto nem relaxamento, mas de precisão e fibra para agir, pôr planos em prática e fazer o que é preciso. Dia sólido e prático.
Sábado, 26 de fevereiro | dia de Saturno
A Lua em Capricórnio encontra o sêxtil com o Sol em Peixes no início da madrugada e o sêxtil com Júpiter em Peixes no fim da manhã: aspectos fracos e fugazes, sem grandes alterações de conjuntura, mas que "umedecem" o humor, trazendo sensibilidade e empatia, se diferenciando um pouco do dia anterior. Atenção à segurança de objetos pessoais, finanças e bens em geral, pois há risco de perda material ou maus gastos.
Um abraço e até semana que vem,