Vivemos os últimos dia da Lunação de Aquário, uma lunação que trouxe denúncia e retirada de figuras públicas da mídia, a maior tragédia já ocorrida em Petrópolis por conta de chuvas, a aprovação da PL do Veneno pela Câmara e a deflagrada de uma guerra internacional. Ufa. A passagem de Marte por Capricórnio, ainda que também tenha promovido entre uniões e reencontros, não tem sido fácil — afinal, esse é um Marte exaltado, mais forte que a Vênus e que faz do conflito mais potente que a conciliação.
O andar da guerra da Ucrânia é assunto complexo e que envolve uma análise apurada de vários mapas ativos para esse país, e por isso escolhi não abordá-lo ou desenvolvê-lo nessa edição (aos apoiadores, no entanto, fica esse adendo: se quiserem que a edição exclusiva desse mês seja uma análise do panorama dessa guerra e seus desdobramentos, respondam esse e-mail ou o post dessa edição no Instagram; se muitos se interessarem, posso fazer esse estudo específico.) O boletim Meio do Céu analisa a astrologia mundana da perspectiva brasileira, ou seja, minha prioridade sempre será o estudo de mapas de eventos diretamente relevantes para nós. Os efeitos mais imediatos dessa guerra que serão sentidos aqui no Brasil certamente aparecerão nos nossos mapas dos próximos meses, então vamos seguir de olho nisso.
Fato é que nos aproximamos agora da última lunação do ano astrológico de 2021. Essa última lunação que antecede o ano novo (marcado pela entrada do Sol em Áries) é bastante importante para o desdobramento do ano astrológico à frente, como se antecipasse os principais assuntos, especialmente no que envolve economia e clima.
No mais, o que falar de um feriado de Carnaval sem Carnaval? Ou melhor, com a privatização da festa gratuita e popular que é um rito de passagem coletivo, que nos permite extravasar a normalidade para podermos iniciar o ano um pouco mais leve, empático e com fé na força da espontaneidade e dos encontros? Uma lástima.
Antecipei o tema do êxtase na edição #23, um tema de natureza jupiteriana, mas o retomo agora, às vésperas da Lua Nova em Peixes, para falar do que há de sublime no carnaval. A experiência da rua em festa é a desordem manifestada como liberdade; a quase tudo no mundo como conhecemos hoje foi dado nome, utilidade e função; tudo está catalogado, medido, quantificado, qualificado e otimizado à exaustão. A vida, porém, é coisa que transcende a lógica e a razão. O inexplicável não tem lugar na rotina. Tem gente que nunca o sentiu, talvez nunca sinta. E não há muita coisa no mundo hoje que nos lembre de que ela, a vida, também tem algo de sagrado. O sublime é parte da experiência humana, e o sublime se faz presente na vida de tantos brasileiros por meio do carnaval. É esse o golpe que sentimos, ao vê-lo tomar a forma de festas privadas e exclusivas: é o fato escrachado de que o sonho e o deleite não está mesmo disponível para todos, nem durante esses seis dias do ano. Júpiter está combusto pelo Sol em Peixes, e o sublime do carnaval ficou abafado dentro de clubes e festas fechadas, como um simulacro triste do que já foi.
Há muitos que pensam que tudo isso é uma bobagem dispensável e inútil à sociedade, claro. A esses, não há muita explicação possível para convencimento, porque a sublimação coletiva não se explica nem se aprende na teoria — compreende quem já viveu na pele. No entanto, vale a reflexão sobre a prática ancestral de alteração de estado de consciência como uma experiência necessária para o equilíbrio da vida, de alternância de ritmo. Envolve viver momentaneamente (e de forma segura para si) um extravasamentoos próprios limites, um ir além de onde seu corpo sozinho conseguiria, um movimento sendo parte do cardume da multidão, uma perda temporária de razão. O sublime também é uma experiência de humildade e de descentramento de si mesmo, de se reconhecer um tanto mais no entorno e nos rostos desconhecidos do que no reflexo imóvel de um espelho.
“Perder-se significa que entre nós e o espaço não existe somente uma relação de domínio, de controle por parte do sujeito, mas também a possibilidade de o espaço nos dominar. São momentos da vida em que aprendemos a aprender do espaço que nos circunda [...] já não somos capazes de atribuir um valor, um significado à possibilidade de perder-nos. Modificar lugares, confrontar-se com mundos diversos, ser forçados a recriar continuamente os pontos de referência é regenerante em nível psíquico, mas hoje ninguém aconselha uma tal experiência. Nas culturas primitivas, pelo contrário, se alguém não se perdia, não se tornava grande. E esse percurso era brandido no deserto, na floresta; os lugares eram uma espécie de máquina através da qual se adquiriam outros estados de consciência.”
— Franco La Cecla, Perdersi, 1’uomo senza ambiente
lunação de peixes: 2 a 31 de março
O encontro da Lua com o Sol em Peixes se dará na casa 9, no mapa levantado para Brasília. Tratamos, aqui, de previsões válidas até o fim do mês, porém mais especificamente até a Lua Cheia do dia 18 — isso porque no dia 20 de março entraremos num novo ano astrológico e o céu se reconfigura num novo cenário geral.
Essa é uma lunação que trata de justiça, diplomacia, conflitos e assuntos religiosos. A continuidade da guerra se vê representada aqui pela conjunção de Vênus e Marte na casa 7, dispostos por um Saturno em Aquário na casa 8: a crise e as mortes no cenário externo se alastram. A situação do Brasil se vê pela Lua em Peixes na casa 9, que troca sêxtis com Vênus e Marte em Capricórnio, mas não enxerga Saturno: um sinal de pouco envolvimento direto com esses assuntos, predominando uma postura pacificadora (já que fortalece Vênus nesse sêxtil). O contexto não vai nada bem e um Marte angular na casa 7 indica a força do conflito durante essa quinzena, mas não parece haver encorajamento do conflito por parte da diplomacia brasileira (que, em tempos de bolsonarismo, é uma caixinha de surpresas).
Esse mapa reacende algum retorno de uma disputa entre o governo e o poder popular, ainda que não seja de forma tão direta quanto durante os meses de inverno de 2021. Estão evidenciados nesse período figuras grandiosas e de poder de influência coletiva, tais como líderes religiosos, mestres renomados e juízes — figuras que podem protagonizar ações de relevância e impacto, movimentando o cenário público. Há uma alternância de fé e esperança com desilusão, já que Júpiter estará combusto pelo Sol até o dia 18. Essa combustão traz preocupações em relação aos temas de casa 2 (questões financeiras e alimentares). Porém, nesse mapa da Lua Nova Júpiter aparece conjunto à estrela fixa Achernar, da constelação de Eridanus, um testemunho de que deve haver resolução ou algum tipo e intervenção sobre decisões tomadas, algo que tende a vir em favor do próprio povo. Isso porque Júpiter, mesmo ofuscado pelo Sol, aparece nesse mapa como um marcador de generosidade, bênção e proteção — mesmo num cenário tão caótico configurado para o exterior. Nós, enfim, ansiando por milagres.
As questões de diplomacia, ética e justiça se fazem presentes, dando continuidade à inquéritos, casos e investigações de interesse público. Com a chegada da Lua em Câncer, de 11 a 13 de março, devem surgir notícias relevantes nesse âmbito jurídico. Outro tema de atenção nesse período são as eleições e as questões de segurança que as acompanham, com possibilidade de intervenções ocultas e sabotagens vindas do Executivo e seus aliados. A questão da legalidade do Telegram, que está sendo pautada pelo uso como ferramenta na disseminação de fake news, por exemplo, é um assunto de forte relevância para esse período. O ingresso de Marte em Aquário no dia 6 realça o tema das eleições e essas preocupações.
Em termos mais subjetivos, essa é uma lunação de forte caráter coletivo, de arrebatamento, da força do cardume frente aos perigos que não cessam. É um cenário de entrega, de se voltar para algum tipo de fé que guie os passos do coletivo — olhar para o cenário maior que nos envolve, o que nos une frente à obstáculos maiores que nós. Peixes é o signo da água mutável, e onde a água se agita e corre solta, é difícil prestar atenção aos detalhes. Somos um milhão de engrenagens fazendo essa grande roda girar, mas olhando de longe, somos tão diferentes assim uns dos outros? Em tudo que é canto dessa terra, vários dos nossos problemas não se repetem nas vidas de pessoas tão distintas de nós?
A chegada da Lunação de Peixes também parece que olha de longe e nos acolhe enquanto coletividade confusa e contraditória — não como indivíduos com nossos nomes de registro, ocupações, identidades, esses aos quais nos agarramos com tanta força, esquecendo que são mutáveis como a água de um rio. No fim das contas, o que é falho também tem direito de existir. Não é lunação de pacificação, posto que são tempos de guerra; mas é uma lunação pra olhar para qual verdade nos orienta e nos aproxima de outras pessoas, tornando-nos companheires de jornada. Espiritual demais? É porque a casa 9 também fala disso. Mas como escreve a bell hooks,
"Quando falo do espiritual, me refiro ao reconhecimento dentro de cada um de que existe um lugar de mistério na nossa vida onde forças que estão além do desejo ou da vontade humana alteram as circunstâncias e/ou nos guiam e nos direcionam. Chamo essas forças de 'espírito divino'."
— bell hooks, Tudo sobre o amor: novas perspectivas
Que essas forças venham, enfim, a favor do bem e dignidade coletiva. Mistério sempre há de pintar por aí. E uma boa Lua Nova para nós!
Um abraço e até semana que vem,