um drink para a Vênus em Áries
É isso mesmo, uma edição extra fresquinha chegou na sua caixa de entrada para dar as boas-vindas ao fim de semana! Para quem não sabe, no mês passado começamos uma nova editoria nessa newsletter chamada drinks para as Vênus, uma iniciativa culinária-astrológica que Ísis inventou para dar vazão ao crescente desejo de inventar e bebericar uns drinks, e também fazer disso uma oportunidade para pesquisar as relações entre ingredientes e suas regências planetárias.
Como explicado na primeira edição, todos os alimentos podem ser associados a um ou mais planetas em termos de natureza e afinidade. Existem tabelas muito antigas de associações entre plantas e os planetas clássicos, mas parte considerável do que conhecemos e usamos aqui no Brasil não está listada nesses materiais. Então essa é também uma oportunidade para estudar e tentar criar uma base de referência de regência para as espécies nativas da nossa terra. No primeiro drink da Vênus em Peixes, por exemplo, levantamos algumas hipóteses sobre o jenipapo, embora ainda sem grandes conclusões a respeito — aliás, para chegar a qualquer achado mais concreto nessas investigações, vamos precisar de tempo para elaborar, testar e pesquisar cada ingrediente (o que é ótimo, já que não temos pressa, e a Vênus dá um giro completo no zodíaco todos os anos).
Como beber em companhia faz muito mais sentido, Mar Muricy se ajuntou nessa empreitada bem no comecinho, e agora tocamos esse projeto em parceria. A receita de hoje, da Vênus em Áries, foi todinha elaborada e discutida por nós ao longo de vários dias. Daí, pra ficar tudo mais organizado, ficou decidido publicar essa série agora em edições extras, separadas da edição regular dos domingos, pra ficar mais fácil de achar o conteúdo depois. Vamos aos trabalhos, então?
a receita
75 ml de Jack Daniel's Tennessee Fire*
25 ml de xarope de gengibre*
4 a 5 cubos de gelo
sal grosso
pimenta calabresa em flocos
urucum (ou colorau, que é a versão já moída)
*ver observações sobre os ingredientes mais abaixo
Comece colocando o sal grosso, a pimenta calabresa e o urucum/colorau num pilão para macerar a mistura, quebrando e diminuindo os pedaços o máximo possível. Daí, coloque essa mistura num prato para preparar seu copo de uísque: a dica é molhar a borda dele com um pouco do xarope para grudar com facilidade. Você pode fazer de um lado só do copo, numa área maior ou menor, como preferir.
Em seguida, acrescente o Jack Daniel’s Fire, o xarope de gengibre e os cubos de gelo direto no copo com a borda preparada — aliás, se você tiver aquele gelo grandão em forma de cubo ou de esfera, pode substituir os vários cubos por apenas ele, que dá certo também. Dê uma misturadinha com uma colher, e ja está pronto! Se quiser, finalize com 1 a 3 gotinhas de pimenta Tabasco na hora de servir.
observações sobre ingredientes
O Jack Daniel's Tennessee Fire é uma bebida mista do tradicional uísque da marca com licor de canela adicionado. Usamos especificamente esse por uma questão de oportunidade, mas saiba que há similares no mercado, como o Fireball (que não conhecemos de gosto, mas dizem ser menos adocicado), e dá até pra pensar em fazer a própria mistura em casa, usando uísque puro e um licor de canela artesanal. Nesses casos, talvez seja necessário fazer um ajuste na proporção das medidas usadas, mas são substituições possíveis.
Já o conhecido xarope Monin aparece na foto dos ingredientes, mas a verdade é que não usamos ele, porque fizemos nosso próprio xarope de gengibre em casa, o que recomendo fortemente por ser bem mais barato, mais gostoso e mais forte do que essa versão pronta. A receita que usamos é essa aqui:
2 xícaras de gengibre descascado e picado bem pequeno (vale usar o processador para isso, caso tenha)
2 xícaras de açúcar
6 xícaras de água
Leve o gengibre e açúcar numa panela no fogo brando, mexendo até o açúcar derreter, e acrescente a água, misturando bem. Depois que pegar fervura, abaixe o fogo e deixe o xarope reduzindo por cerca de uma hora, ou até ele pegar aquela consistência mais melada (mas não se engane, pois ainda vai estar com uma aparência bem líquida ao final, é assim mesmo). Espere esfriar, coe com uma peneira e coloque na geladeira para usar no drink que quiser (inclusive não-alcóolicos!). Guarde o xarope num vidro bem higienizado com tampa e conserve na geladeira. Dura por cerca de um mês.
notas astrológicas sobre a criação
A primeira coisa que pensamos sobre esse drink foi que ele não deveria ser muito floreado: deveria ser um coquetel direto, curto e até simples, em contraste total ao drink da Vênus anterior, que envolvia alguns preparos prévios e muita coisa misturada. Áries é um signo regido por Marte (por domicílio) e pelo Sol (por exaltação), dois astros considerados de natureza quente e seca na teoria astrológica. Não combinaria mesmo inventar uma receita com muita complexidade: Marte é um planeta que trata de coragem, assertividade e confiança, sem tempo para rodeios, e Áries é o signo que inaugura o zodíaco, o fogo cardinal, que inicia processos.
“Áries é a faísca que surge da fricção e produz a chama. Ou a chama que irrompe no breu, iluminando o que está ao redor: é um fogo novo e simples, como o acender de um fósforo numa casa escura.” [trecho daqui].
Desse entendimento da simplicidade, partimos para pensar qual seria o álcool da receita. A cachaça parecia uma boa ideia para um signo de Marte, mas pensamos que talvez fosse melhor algo mais solene, um tipo de bebida que impusesse alguma “autoridade”, pelo fato de Áries também ser regido pelo Sol, luminar que trata do poder. Entre idas e vidas, chegamos à ideia que se tornou o cerne desse drink: o uísque misturado com licor de canela. O uísque é uma bebida amadurecida, de cor dourada, culturalmente associada aos paladares e às figuras mais velhas — e ainda com a pitadinha da canela, que é uma especiaria totalmente marcial, pra ter participação do regente principal aí também.
William Lilly, famoso astrólogo do século 17, diz que Marte “encanta-se com a cor encarnada, ou amarela, fogosa e brilhante como o açafrão, e com aqueles sabores que são amargos, agrestes e que queimam a língua; dos humores, a cólera”. De fato, outra coisa que tínhamos certeza, é que esse deveria ser um drink picante. Lilly atribui à natureza de Marte as ervas que se aproximam do vermelho, de folhas pontiagudas e afiadas, cujo gosto é cáustico e ardente, e que gostam de crescer nos lugares secos. Ele lista uma série de plantas como exemplos, e cita especificamente a pimenta e o gengibre, dois dos ingredientes que escolhemos usar por entregarem bem a ardência necessária para o drink. O xarope de gengibre que fizemos ficou até bem forte, mas também trouxe doçura, bom para equilibrar o uísque e a picância.
Por fim, a bordinha veio como uma forma de dar um pouco mais de graça pra coisa toda, podendo ser experimentada na medida do gosto de quem bebe. O urucum era um tempero que eu tinha guardado na cozinha há tempos, sem muita oportunidade de usar (por ser bem duro, difícil de moer) e o sal é de natureza quente e seca, reforçando a natureza dos dois regentes de Áries. A pimenta calabresa, por vir em flocos e ser forte, pareceu uma boa pedida para ser servida também na borda; já a pimenta Tabasco é um adicional opcional direto no líquido mesmo, pra quem quiser sentir ainda mais o sabor apimentado. O gelo, finalizando tudo, veio na intenção de que esse deveria ser um drink palatável, ainda que forte e ardente — afinal de contas, ainda estamos falando de Vênus, um planeta de prazeres (e o calor do Rio de Janeiro está de matar).
Esperamos que vocês gostem e testem essa receita. Aliás, se fizerem, não esqueçam de nos marcar nas redes, viu? No mais, desejamos um bom fim de semana pra vocês. E um brinde à Vênus em Áries!