A Lua cresce a galope no signo de Sagitário. A Lunação ainda é de Touro, iniciada naquela última Lua Nova lá do dia 19, e seguimos nesse ciclo até o fim da minguante, em 17 de junho. Curiosamente, porém, a Lua enche em Sagitário — isto é, teremos uma Lua Cheia em Sagitário atravessando a Lunação de Touro, ao contrário do que é mais costumeiro, com a Lua Cheia ocorrendo no signo oposto à Nova. De tempos em tempos, devido à diferença do ritmo do Sol e da Lua no céu, ocorrem duas Luas Novas no mesmo signo; foi o que ocorreu esse ano, em março em abril, no signo de Áries. Agora, até meados do ano que vem, todos os ciclos lunares virão nesse certo descompasso entre signos da Nova e da Cheia.
Cá entre nós, esse desencontro é apenas mais um “porém” dentro do sistema astrológico que, embora funcione muito bem, não é tão perfeito nem quadradinho assim. Na verdade, a astrologia é mesmo só um código para lermos a qualidade do tempo como grandeza manifestada na realidade. A natureza e seus ritmos se comportam da forma que são, com fluxos e pausas, retomadas e desvios. É o olhar humano, curioso, busca decifrar a todo custo o que há por trás do funcionamento das coisas, procurando encaixes perfeitos; a astrologia é mais um dos frutos dessa busca. Mas a gente não pode esquecer que dar nomes às coisas — Lua Nova em Touro, Lua Cheia em Sagitário — é, sobretudo, um esforço de tentar ordenar e entender o que escapa à nossa compreensão humana. A pergunta que fica é: como uma Lua Cheia em Sagitário vem amadurecer um ciclo iniciado por uma Nova em Touro? Tenho alguns palpites.
“Os rios enche na lua cheia. […] Tem gente que fala que a lua não tem a vê com isso não... pra plantá, pra colhê, pra semeá, pra fazê viveiro, pra podá, tudo a lua manda. Se você poda um pé de manga na lua minguante ela vai brotá na lua nova, e aí ela vai crescê na crescente, a tendência dela é não morrê nunca. Por isso que eu digo pra vocês: a natureza ela é completa, agora Deus deixô cada um pra saber decidir o que a natureza é.”
— Dona Flor1, quilombola da comunidade Moinho, em Alto Paraíso de Goiás
Escrevi sobre o início desse ciclo sobre colher o que se plantou: uma lunação que se inaugurava já com um forte sentido de tangibilidade, de experienciar de forma mais direta e sensível os efeitos de processos em curso há um certo tempo. Touro é a terra fixa, o que se obtém de concreto e vistoso a partir do esforço material empreendedido. Que colheita foi possível fazer dessa primeira metade da lunação, do dia 19 até aqui? Para alguns, esse pode ter sido um período proveitoso e recompensador; para outres, pode ter chegado a conta sobre certas faltas e carências que não podem mais ser deixadas de lado. (Eu mesma, inclusive: tive uma amigdalite agudíssima com abscesso que me levou à uma internação hospitalar, algo inédito para mim. Não por acaso, nas partes do corpo humano, Touro é um signo relacionado à garganta.)
Agora, a Lua Cheia em Sagitário chega para remarcar os significados da segunda metade desse ciclo: na virada desse sábado para o domingo, precisamente às 00:41 (horário de Brasília) do dia 4 de junho, a Lua alcança oposição exata ao Sol — uma noite de Lua Cheia daquelas, com a Lua no ápice de seu tamanho no céu noturno.
Se Touro é terra fixa, Sagitário é fogo mutável: depois da fartura da colheita, da fome saciada e da experiência da degustação, vem o quê? O momento de digerir isso tudo aí, é claro. O fogo digestivo é uma boa imagem para se pensar no signo de Sagitário, aliás, que versa justamente sobre a capacidade de transformação das substâncias, abrindo oportunidade para alterar as condições dadas. Nada fica estagnado para sempre, nem mesmo o que há de ruim: Sagitário simboliza bem esse estado de renovação tão importante nos ritmos da vida, e não à toa é um signo tão estimado no imaginário popular. A chama de esperança e otimismo precisa seguir ardendo pra gente não viver em mesmice, amargura e apurrinhação, sem outras perspectivas.
Então um primeiro significado dessa Lua Cheia sagitariana tem a ver com o conceito de digestão: o fogo mutável chega para elaborar o que ficou estagnado, bloqueado, empacado no caminho. O que pesou no estômago ou atravessado na garganta. Eliminar resíduos, sobras, o que não presta mais. Cantar pra subir.
“A gente esquece que pra se curar de alguma coisa, é porque se envenenou, né? E daí se aprende a curar se intoxicando, precisando digerir o veneno. Literalmente ou metaforicamente. Incomodando lá no âmago, sentindo bem forte o que não desceu bem, para aí poder fabricar alguma defesa que proteja das invasões futuras. Não é fácil nem gostoso, mas melhor a possibilidade da cura do que o esmorecimento.” [trecho desse post, de 2020, sobre outra Lua em Sagitário]
Um segundo significado tem a ver com transgredir para remediar. Essa é uma Lua Cheia enérgica, carregada de voracidade e fome de vida. Sensação de liberação, de permissão, de vigor para agir e fazer o que merecemos e temos direito. E aí eu preciso lembrar que há muitas formas de cura e remediação de situações difíceis ou ruins, e que a liberdade de agir e experienciar os próprios desejos é uma delas. A cura, às vezes, vem dos lugares e situações menos esperados. É preciso certa coragem e peito aberto para agir e receber sobre o que se tem vontade, sabe? Não deixar empacado o que pede passagem para circular. Essa interpretação, aliás, tem muito a ver com o que Indi escreveu numa newsletter com conselhos do tarô para junho:
“A importância de despirocar, abusar do prazer, exceder e até mesmo se passar como um evento restaurador. Nossa humanidade tem fome de vida e buscar por prazeres é uma característica saudável, na dose correta, que nos tira da mesmice e nos relembra que se a gente sempre fizer tudo ‘certo’, vamos enlouquecer, ou pior, nunca vamos nos conhecer direito.” [recomendo a leitura completa aqui]
Para algumas pessoas que tendem a estar mais expostas a críticas ou controvérsias, essa quinzena também carrega um risco maior de “se passar” — especialmente no campo da linguagem e da comunicação, um território que pode oferecer teimosia e discórdia. Porém, penso que, num âmbito geral, prevalece um cenário favorável de restauração, experimentação e liberação das tensões: a Lua Cheia em Sagitário recebe combustível do Marte em Leão e desafia os limites ambíguos de Saturno em Peixes; Júpiter dispõe a Lua e também o ascendente do mapa da Cheia para o Brasil, direcionando a sede de vida para o cenário dos encontros, encruzilhadas, ruas e passagens; Vênus, outra regente do ascendente, está jubilada na casa 5. É tempo de botar a cavalaria na rua, sentir vento no rosto, encontrar e desencontrar, desafiar o próprio medo, dar vazão às vontades do corpo. Assim também se cura e se alivia a dor — podemos nos chamuscar um pouco no caminho, mas ficar inerte pode ser muito pior. Bora viver.
Lunação de Touro
Lua Cheia em Sagitário: previsões até 17 de junho
Vamos, então às previsões mais concretas para nossa coletividade. Desde a Lua Nova no dia 19 de maio, aconteceu de tudo um pouco no cenário político e social brasileiro, sem qualquer calmaria, como prometido. A próxima quinzena dá continuidade à essa agitação toda, mas com a promessa de algumas definições. Até o fim da lunação teremos ingressos de Vênus em Leão e Mercúrio em Gêmeos, duas quadraturas importantes entre superiores e o início da retrogradação de Saturno em Peixes.
Esse é um mapa de exigências, insurgência, uma dose de revolta também. Me parece que o campo em que essas ordens e imposições se devem ver especialmente nos cenários de casa 5: temas a ver com direitos reprodutivos, mulheres, crianças, infância, ou também com assuntos de artes, mídia e entretenimento. O prazer, lazer e o brincar se veem aqui como direitos a serem reclamados: tanto a Vênus rege o ascendente por exaltação e está jubilada nesse local, como a Lua é regente da própria 5 e está Cheia, gritante, no alto da casa 10. Reivindicações ligadas a esses setores podem retornar de forma bem relevante, exigindo direcionamento e estratégia para serem encaminhados adiante, ainda que a médio prazo. O dia 11 de junho parece ser uma data de relevância para eventos reunidos nesse campo de significado, de forma corajosa e propositiva.
Muitos olhos estão voltados ao julgamento do STF sobre marco temporal, marcado para o próximo dia 7 de junho. Na Lua Nova escrevi que esse era um tema bem fragilizado no âmbito do Congresso, devido à quadratura Marte-Júpiter; de fato, a Câmara aprovou aprovou o projeto de lei do marco temporal para a demarcação de terras indígenas, que seguirá para para análise do Senado, ainda sem previsão de data. Em paralelo, o julgamento no STF é uma forte aposta para derrubada da tese do marco temporal, garantindo os direitos dos povos indígenas sobre seus territórios. A meu ver, essa virada da Lua Cheia e o céu do dia 7 de junho vêm favorecer esse tema: Júpiter estará a 4° de Touro, grau exato da Vênus do mapa anual para o Brasil. É um indício bem favorável de proteção e garantia de direitos aos povos originários, ainda que a Lua caminhe de Júpiter para Marte ao longo da tarde e noite desse dia. Não acho que seja um páreo fácil, mas é promissor sim: o dispositor do Sol, inclusive, é um Mercúrio unido em Touro com Júpiter.
Júpiter em Touro rege por domicílio o ascendente desse mapa e ocupa a casa 3 com Mercúrio: me parece que processos de legislação e ordenação também ocorrem no âmbito das mídias e comunicações, o que dá sinal à uma retomada significativa dos processos ligados ao PL da fake news, por exemplo.
Diferentemente do que foi apontado no início da lunação, que marcava a forte possibilidade de mais danos à parlamentares, como já vinha ocorrendo desde o início de maio, essa segunda metade da lunação de Touro não traz o tema de punições de modo tão incisivo, mas há um evento significativo: a quadratura de Mercúrio em Gêmeos com Saturno em Peixes no dia 15 de junho indica a forte possibilidade de cassação de mandato e até prisão de uma figura política menor, provavelmente alguém bem ligado ao campo da comunicação, bem conhecido pelo que fala ou articula nas mídias.
No mais é isso aí: uma quinzena de alguns avanços, abertura de espaço pra coisas novas, movimentações estratégicas. Saturno em Peixes carrega um tanto no ascendente, podendo trazer confusão de expectativas e falta de perspectiva — especialmente nos dias finais na lunação, já que ele começa sua retrogradação no dia 17. Até lá, a Lua estará minguante e a sensação de um certo vazio após tanto vigor, dispersão de energia e agitação pode abater um pouco a vitalidade, mas isso também passará. Vão viver, mas procurem não estourar todos os limites. Desejo uma boa Lua Cheia para nós!
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a citação está num livrinho precioso chamado “O partejar e a farmacopeia de Dona Flor: História e ensinamentos de uma mestra quilombola”, publicado pela Avá Editora em 2022 e disponível gratuitamente como audiolivro no Spotify.
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Mais uma edição maravilhosa!