edição #96, Ingresso do Sol em Libra
equinócio de primavera e previsões para o trimestre no Brasil
Na madrugada deste sábado, 23 de setembro, o Sol ingressou no signo de Libra. É o equinócio, a chegada da primavera no hemisfério sul; ou então, o ingresso do Sol em sua queda — como chamamos esse posicionamento no “astrologuês”. São muitas as formas de nomear esse evento, mas o fundamental é que está inaugurada a segunda metade do ano astrológico de 2023 que segue até março de 2024.
Para nós, habitantes da porção sul do mundo, inicia-se a temporada de plantio dos principais grãos que nos servem de alimento. Em tempos de crise climática, essa não é uma tarefa simples: se faz urgente botar na balança o que é realmente necessário para prover e distribuir fertilidade, fornecer alimento, proporcionar vida a mais pessoas — ou o que é necessário, enfim, para resistir ao processo de escassez e aniquilação que sofremos hoje. Quem me acompanha há mais tempo pode se lembrar dessa citação, já que é a terceira vez que a trago na ocasião do equinócio de primavera. Peço licença para relembrar:
“Alguns povos têm um entendimento de que nossos corpos estão relacionados com tudo o que é vida, que os ciclos da Terra são também os ciclos dos nossos corpos. Observamos a terra, o céu e sentimos que não estamos dissociados dos outros seres. O meu povo, assim como outros parentes, tem essa tradição de suspender o céu. Quando ele fica muito perto da terra, há um tipo de humanidade que, por suas experiências culturais, sente essa pressão. Ela é sazonal, aqui nos trópicos essa proximidade se dá na entrada da primavera. Então é preciso dançar e cantar para suspendê-lo, para que as mudanças referentes à saúde da Terra e de todos os seres aconteçam nessa passagem. Quando fazemos o taru andé, esse ritual, é a comunhão com a teia da vida que nos dá potência.”
— Ailton Krenak, trecho de A vida não é útil [grifos meus]
O Sol em Libra pode expressar a queda literal ou simbólica de figuras centralizadoras, pontos de referência e verdades aparentemente absolutas. É um ponto temporal de desestabilização do poder, que antes parecia íntegro, coeso e inabalável. Este ingresso solar pode, então, anunciar um tempo de renúncias de convicções e certezas; de lidar com duras verdades, como a de que não há um único salvador possível para os problemas tão complexos que nos afligem. De jogar luz à perspectiva (potencialmente angustiante) de que a vida se estrutura, se define e faz sentido por meio dos vínculos de afeto — isto é, dos atos de afetar e ser afetado — que tecemos ao longo dela. Que “ser”, “estar” e “poder” apenas individualmente — ou o tempo todo — não dá conta da vida que nós vivemos, porque ela só existe em relação.
A queda do Sol em Libra me lembra aquela máxima de que, não raro, os incômodos que enxergamos nos outros costumam espelhar dificuldades que são nossas. Me lembra também da percepção de que um problema que a princípio é só meu, na verdade é compartilhado de forma similar por tantas pessoas. É de Libra, afinal, o elo invisível que enlaça nós e outros seres e coisas ao nosso redor: é o ar cardinal, que se desloca e versa “sobre viver plenamente a experiência social e estética das trocas por meio da iniciativa da comunicação.”
No melhor dos cenários, um novo encontro é como um portal para outra dimensão compartilhada — cheia de descobertas e possibilidades — e que suspende, por algumas horas, o cotidiano bem conhecido.
Fiz essa colagem há algumas semanas e a publiquei no Instagram, acompanhada da legenda acima. Eu penso muito com as imagens e tenho percebido que, às vezes, elas também me dizem coisas que demoro a entender plenamente. Hoje, essa me parece a composição perfeita para representar o ingresso do Sol em Libra: um Sol despido de si mesmo, destituído da própria autoridade, como se seu poder estivesse derramado em tudo e todos ao seu redor, espalhado entre os vínculos de afeto dos quais se nutre. Mas o que sobra de si mesmo quando tais interlocutores saem de cena? Quanto tempo essa estrutura interna suporta até que desabe sozinha?
Vamos mais fundo: conceitualmente falando, o ingresso Sol em Libra marca uma temporada de instabilidade da soberania e da perda de certezas e convicções justamente porque é da natureza das relações serem assim, marcadas pela inconstância. A colagem ilustra o momento de vulnerabilidade, o mergulhar de cabeça num espaço-tempo com outra pessoa, algo que é sentido com mais nitidez no momento em que se conhece alguém novo. Porém, pensando melhor, esse “buraco” vulnerável da insegurança e indeterminação nunca se fecha totalmente – ele é um elemento participante de todas as relações, das mais efêmeras às duradouras, pois há sempre algo que escapa, falha ou frustra em cada uma delas. É parte constituinte da experiência humana: por mais confortáveis e seguros que estejamos na companhia de outres, o preenchimento nunca se dá por completo — o vazio, afinal, também é uma presença. Talvez o Sol decaia em Libra porque, no fim das contas, se relacionar é aprender a dançar ao redor do buraco que insiste em permanecer.
“O poema ensina a cair
sobre os vários solos
desde perder o chão repentino sob os pés
como se perde os sentidos numa
queda de amor, ao encontro
do cabo onde a terra abate e
a fecunda ausência excedeaté à queda vinda
da lenta volúpia de cair,
quando a face atinge o solo
numa curva delgada e subtil
uma vénia a ninguém de especial
ou especialmente a nós numa homenagem
póstuma.”— Luiza Neto Jorge, poeta portuguesa
E com isso, partimos para o panorama de previsões sobre o terceiro trimestre do ano astrológico de 2023 no Brasil.
Ingresso do Sol em Libra
previsões gerais para o Brasil até 21 de dezembro de 2023
Escrever sobre um trimestre é um tanto quanto desafiador, pois não é um período curto como o tempo de uma lunação, nem tão longo quanto um semestre. Para não correr o risco de ficarmos “nem lá nem cá” na definição das previsões, fiz um esforço para trazer uma espécie de síntese geral do que podemos esperar até dezembro — o detalhamento mais específico seguirá sendo interpretado à luz dos mapas de Lua Nova e Cheia, quinzenalmente, como é de costume por aqui. Para complementar, abri uma caixinha no Instagram essa semana perguntando sobre os temas e questões de interesse de vocês sobre esse mapa e, então, fui analisando conforme os assuntos iam aparecendo.
Sem mais delongas, vamos lá:
Dentro do desenrolar deste ano astrológico, esse terceiro trimestre é definitivamente um grande clímax: é nesse período que teremos vários trânsitos planetários relevantes, lunações significativas e também um baita eclipse solar no dia 14 de outubro, bem visível em todo o Brasil, em especial nas regiões Norte e Nordeste (teremos uma edição especial apenas sobre ele, é claro). É um trimestre intenso, definidor e concentrado: com a ênfase dos signos fixos e planetas angulares transitando em ritmo lento, parece que a passagem do tempo deve ser sentida com mais lentidão até dezembro, numa densidade maior de eventos tomando forma, contorno e encaminhamentos.
Há promessas de ganhos e avanços, mas também desafios e pontos de fragilidade e ruptura, ainda que nem todos os trânsitos nos afetem diretamente. Embora o eclipse ocorra um pouco antes e vá balançar algumas estruturas, o intervalo de 28 de outubro a 10 de novembro parece ser o mais turbulento até o fim do trimestre, com a confluência de uma série de aspectos complicados e uma Lua Cheia daquelas.
Comecemos pela parte boa, que é a impressão geral sobre o país: um mapa noturno com ascendente a 19° de Leão conjuntíssimo à Vênus é sinal de que dá pra respirar com certo alívio, sabe? A regência do ascendente pelo Sol em queda não seria das melhores, mas sua recepção com essa mesma Vênus ajuda muito; reforça a leitura de que será, sim, um trimestre de instabilidades e inconstâncias, mas que caminham em direção a avanços e melhorias para a coletividade — mesmo que, em vários casos, de forma mais lenta do que gostaríamos.
Júpiter em Touro - angular e em boa recepção com Vênus - também é benéfico para o governo federal, o que certamente contribui para a condição do país como um todo. O bom aspecto entre Vênus e Sol, inclusive, mostra maior simpatia e popularidade do governo internamente. Já o Júpiter em Touro na casa 10 conjunto à estrela Almach, a meu ver, carrega o principal testemunho da presença relevante de uma figura feminina associada ao governo, alguém de natureza “jupiterial”, isto é: intelectuais, líderes sociais, pessoas respeitáveis, religiosos ou… juristas. Sim, esse Júpiter me parece um testemunho sólido de que a indicação de um novo nome ao STF é uma mulher. Ele pode estar representando outra mulher de destaque numa posição simbolicamente similar? Sim, mas há outros testemunhos astrológicos que nos permitem essa interpretação, de modo que consigo delinear a previsão de uma nova ministra no STF. (E, sim, estou torcendo.)
Agora falando especificamente do presidente Lula: ele vem representado pela Vênus angular, indicando um ganho em diplomacia, política e conciliação entre setores de interesses distintos. As relações internacionais parecem ser um grande destaque positivo do Brasil até o fim do trimestre, com com destaque para o tema das negociações internacionais, previsto desde o começo do ano, especialmente no que envolve a área ambiental:
“São as áreas da indústria, construção e infraestrutura em diálogo com os temas de meio ambiente, ecologia e sustentabilidade. Já escrevi na edição sobre Saturno em Peixes sobre a urgência de mudanças na indústria como uma imposição desse trânsito — sob o risco de os negócios simplesmente ficarem para trás mesmo, ainda mais no contexto global —, e aqui esse significado ganha mais definição. (…) O ponto é que, para esse ano no Brasil, existe a grande possibilidade de receber investimentos externos para seguir numa direção de desenvolvimento mais alinhada à uma política ambiental responsável, e com margem para impactos locais positivos.” [trecho da edição #79]
A pauta da transição energética ganha ainda mais destaque e interesse, muito embora não acene para grandes mudanças ou novas medidas a curto prazo; é possível que alguns acordos sejam revistos e que haja falhas ou perdas em acordos e negócios com outros países, mas não a ponto de causar grande prejuízo para nós. Economicamente, aliás, o cenário interno é melhor: um veloz Mercúrio em Virgem ocupa a casa 2 do mapa do país, num trígono próximo à Júpiter conjunto ao Lote da Fortuna, indicando boas condições materiais e de gestão dos recursos. Questões orçamentárias e financeiras devem ser o maior foco no Congresso nos próximos meses. A reforma tributária parece que sai, provavelmente lá pra dezembro, a partir do trânsito de Mercúrio em Capricórnio (que será longo, pois irá retrogradar) – na prática, um tema do finzinho desse trimestre, se desenvolvendo com mais força no próximo.
A população ou as “pessoas comuns” (olá, nós mesmes!) é representada por uma Lua crescente em Capricórnio na casa 6, condição que indica algum nível de prejuízo, enfrentamento de adversidades e restrições, infelizmente. Há uma série de significados possíveis aqui e que podem coexistir: questões de saúde pública podem voltar à tona, especialmente no que concerne à população de idosos. Cuidados com saúde mental e estresse devem ser redobrados, bem como prevenção de acidentes nas ruas, essa última devido à quadratura entre Lua-Marte. Outro desdobramento danoso que essa Lua exilada de casa 6 representa é a maior suscetibilidade e vulnerabilidade da população para questões climáticas, a destacar as chuvas e enchentes típicas do nosso país — o período mais crítico nesse ponto é de 28 de outubro a 26 de novembro. Há de se considerar que o estado geral do país pode ajudar no enfrentamento a essas dificuldades sinalizadas pela Lua, inclusive no quesito econômico, mas não anula o maior risco de situações graves em decorrência da crise climática ocorrerem nesse período. Outro possível testemunho dessa Lua em Capricórnio é de levantes populares e questões trabalhistas, que parecem ganhar força no trimestre, possivelmente até incentivando greves, manifestações e reformas em setores primários de indústria e trabalho; há pouca visibilidade geral e cobertura midiática, mas me parece um assunto de relevância.
As descriminalizações do aborto até 12 semanas e do porte de drogas no STF são votações que carregam bastante expectativa. A melhor forma de avaliar o desenrolar delas será pelos mapas das próximas lunações, mas adianto o seguinte: há testemunhos de avanços e progresso na discussão desses temas, porém nada parece se definir com agilidade e rapidez, de modo que os processos devem ficar "entrecortados" até o fim do trimestre, em 21 de dezembro. Além disso, o principal obstáculo nos próximos meses parece ser a pressão e organização da oposição frente ao debate. Essa parte vai dar trabalho.
E o caso Marielle? Na edição especial que escrevi sobre ele, comentei sobre o retorno de Júpiter à 11° de Touro no fim de outubro, um grau importante que vem sendo ativado nos momentos mais decisivos desse processo. Eu reforço aqui essa previsão, com um adendo: a Lua Cheia em Touro de 28 de outubro me parece ser particularmente significativa em relação a esse caso como um todo. No mapa desse dia teremos a oposição exata entre Júpiter em Touro e Marte em Escorpião, bem no grau 11°. Veremos.
Os setores militares aparecem bastante enfraquecidos desde o Ingresso Solar em Câncer, e assim parecem permanecer até dezembro: bastante prejudicados e desorientados, com grande risco de terem figuras importantes sofrendo punições ou danos. Não é um cenário favorável e o trânsito de Marte em Escorpião (de 12 de outubro a 24 de novembro) aumenta a pressão sobre eles.
Terminando “pra cima”, falemos de arte: curiosamente, parece um trimestre de proeminência da produção artística nacional, inclusive em termos de incentivo e visibilidade no cenário internacional. Isso pode se mostrar de forma mais evidente até dezembro, inclusive por meio de iniciativas ligadas ao governo federal e parcerias com outros países, por exemplo. Com uma Vênus cravada no ascendente, é certeza que teremos uma safra generosa de produções e performances marcantes entre figuras desse meio (não sem uma dose de controvérsia midiática, já que a Vênus dialoga com Sol e Marte em Libra na casa 3). Para artistas de destaque, no entanto, o saldo é positivo — e lucrativo, eu diria.
Por hoje é isso, minha gente. Espero voltar semana que vem com novidades e a leitura do mapa da Lua Cheia em Áries. “Tranquila” é improvável demais, mas que seja, pelo menos, uma primavera proveitosa para nós.
Um abraço e até a próxima,
Ísis
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Melhor news 🌞
que surpresa boa ter descoberta essa news por acaso! tô encantada com a leveza da sua escrita e da forma como vc faz a astrologia ser acessível pra leigos e meros mortais hahahaha me encantei com a sua colagem e já fui logo seguir seu trabalho no insta ♥️ escrevi minha primeira edição da news essa semana e falei justamente sobre o vazio por conta desse ep da Lela e olha como as coisas estão conectadas! Uma frase sua me tocou profundamente nesse texto: “se relacionar é aprender a dançar ao redor do buraco que insiste em permanecer”. todo esse papo sobre o vazio, falta, buracos, me lembrou demais o livro da Ana Suy, “a gente mira no amor e acerta na solidão”. se ainda não leu, deixo aqui de recomendação! um beijo :)